Estava num voo da Latam, poltrona 7C, quando a comissária veio até mim, me chamou pelo nome e me convidou para sentar um pouco mais à frente, onde havia mais espaço e eu poderia ficar mais confortável.
A atitude me surpreendeu e, de alguma maneira, ressignificou toda a minha experiência com a empresa.
O que foi necessário para que esta ação relativamente simples acontecesse?
Treinamento, sistemas, briefings, orientações, governança, indicadores de desempenho, ferramentas à disposição da comissária e, sem dúvida nenhuma, acima de tudo, atitude.
Além da complexidade de implantar um processo para milhares de voos por mês e de todo o suporte, esta pequena atitude não aconteceria, se de alguma maneira a empresa não estivesse criando uma mentalidade voltada à qualidade.
E é este ponto que, como gestor obcecado pela qualidade, gostaria de explorar: a criação de uma mentalidade de qualidade, que guia as ações da empresa em todos os níveis de operação e gestão.
E mentalidade - seja lá sobre o que for, custo, qualidade, excelência no atendimento - é algo que depende de muito foco, esforço de comunicação contínuo, alinhamento de objetivos em diversas esferas da organização, sintonia entre os KPIs, incentivos, prioridades de investimento, treinamento e centenas de horas dos gestores para que efetivamente aconteça.
A qualidade que vem do mindset é a mais difícil de atingir, porque não é determinada apenas pelo quanto podemos gastar, mas deriva do esforço para que toda empresa se mova na mesma direção, de maneira consistente e duradoura.
Qualidade na prestação de serviços é uma construção, exige regularidade, deve acontecer de manhã, à tarde e à noite, quando todos estão vendo, quando ninguém está vendo, quando o passageiro é premium ou quando é a sua primeira viagem.
Claro que um serviço de qualidade depende de quanto estamos dispostos a gastar em itens que fazem diferença ao consumidor, mas o mindset ajuda a empresa a maximizar estes gastos, gerando um valor adicional, que só as companhias com esta mentalidade conseguem. Na prática, é possível fazer mais com uma quantidade menor de recursos.
Nesta equação, além do foco em processos, é importante a disposição em ouvir todos os feedbacks, tentando entender em quais pontos podemos melhorar. Normalmente quando estamos tentando fazer o melhor, não achamos alguns feedbacks justos, e muitos não nos deixam confortáveis, mas aqui o ponto principal é ouvi-los e aproveitá-los para impulsionar o mindset.
Outro ponto fundamental é a governança, agregando os feedbacks recebidos, os planos de ação de melhorias operacional, os custos envolvidos para as mudanças, o planejamento para que as melhorias sejam implementadas e os indicadores de desempenho medidos. A governança garante a constante atenção e comprometimento da empresa com a perpetuidade da mentalidade em criação.
Em aeroportos, a soma de pequenos fatores faz o passageiro perceber um ambiente de qualidade. Aeroporto silencioso, onde speeches não automatizados são evitados ao máximo, ambiente limpo, bem iluminado, wayfinding claro, canal de inspeção rápido são os primeiros itens que impactam o cliente.
Outras iniciativas como diminuição de poluição visual, seja da publicidade ou das comunicações de cias aéreas e do próprio aeroporto, e colaboradores prontos para orientar e apoiar o passageiro também ajudarão a compor um ambiente onde as pessoas se sentem bem.
Treinamento de todos os stakeholders que têm contato com o passageiro, da limpeza ao caixa do estacionamento, e opções de alimentação e bebidas a preços razoáveis, se quisermos que o aeroporto não seja apenas a alternativa inevitável de consumo, também são maneiras de influenciar e criar esta mentalidade.
Atenção incansável aos detalhes ajuda a forjar o mindset necessário para que a qualidade seja duradoura. Uma qualidade baseada em processos focados nos pontos de contato e estresse do passageiro e alimentada por indicadores e feedback constantes.
Somados, todos estes fatores são geradores de experiência, à medida que são percebidos pelos clientes e confrontados com as respectivas expectativas. Isso está intimamente ligado a percepção de qualidade em serviços, quando temos elementos intangíveis envolvidos no processo, tais como confiabilidade: traduzida na habilidade em executar de forma segura e eficiente o serviço; tangibilidade: instalações físicas, equipamento, e elementos que podem ser percebidos pelos sentidos humanos; responsividade: a forma atenciosa, com precisão e rapidez de resposta, garantia: o conhecimento dos trabalhadores e sua habilidade de transmitir confiança; e por fim mas não menos importante a empatia: o quanto a empresa importa-se com o seu cliente verdadeiramente.
Em geral, os instrumentos estão disponíveis para todos fazerem, mas só um processo bem planejado e incansável que se retroalimenta será capaz de sustentá-lo a longo prazo.
É muito fácil limpar um aeroporto, atender um passageiro importante, ter alguns dias de operação perfeita, mas apenas geramos valor, quando fazemos isto de maneira consistente.
Neste sentido, a criação da mentalidade é o que viabiliza e perpetua um ambiente de qualidade e vantagem competitiva. Afinal, qual empresa não quer, como a Latam conseguiu em um simples gesto comigo, marcar uma experiência positiva com os seus clientes?